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Manifesto de apoio aos familiares de vítimas da violência policial e suas formas de organização



Desde o I Encontro de Enfrentamento à Violência Policial do Paraná, organizado pela Rede Nenhuma Vida a Menos e realizado no dia 26 de agosto de 2023 na Reitoria da Universidade Federal do Paraná, familiares de pessoas que foram vitimadas pela polícia no estado vêm sofrendo ataques desonestos e tendo a proposta da ação distorcida por exercerem seu direito de lutar por justiça e pela memória de seus entes queridos.

As forças policias e seus defensores, ao receberem críticas por suas práticas violentas - críticas essas fundamentadas em dados, pesquisas e também relatos de experiência - criaram após o evento, um pânico em torno de um debate sério, na tentativa de deslegitimar um movimento importante que está comprometido em buscar o fim da brutalidade policial.

Através de falas em sessões plenárias na Assembleia Legislativa do Estado do Paraná, alguns deputados acusaram de bandidos, sem qualquer investigação ou prova, todas as pessoas que foram vitimadas pela polícia e também seus familiares. Era de se esperar que os responsáveis pela criação de leis em nosso estado soubessem que “caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime” é ilegal, como prevê o artigo 138 do Código Penal.

Também era de se esperar que os deputados soubessem que, ainda que algumas das vítimas já tivessem cometido algo ilícito ao longo de sua vida, não é tarefa da polícia o julgamento de qualquer ato. E que assassinar alguém por cometer alguma infração, ou seja, a pena de morte, não é legítimo em nosso país. Ao parabenizar a polícia por tirar a vida de jovens que sequer tiveram a oportunidade de se defender, os deputados incentivam uma prática brutal e ainda querem nos vender que esse é um projeto de segurança. Segurança para quem?

Segundo o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), somente no ano de 2022 as forças policiais do Paraná ceifaram a vida de 488 pessoas. É um número alarmante, que representa um aumento de mais de 17% em relação ao ano anterior e 27% em relação a 2020 - sem falar nos casos subnotificados. Uma organização de defesa de policiais, em uma nota de repúdio ao Encontro, levantou que as forças de segurança também são vitimadas nessa guerra: 9 policiais morreram em confronto de 2016 até hoje. Colocar esses dados em comparação é um atestado de culpa.

A instituição policial historicamente perpetua violências sistemáticas contra alguns grupos, como os povos originários, negros e pobres. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública e o Anuário de Segurança Pública, houve no Brasil um aumento na letalidade da ação policial e o perfil dos assassinados pelo Estado é de homens (99,2% das vítimas no primeiro semestre de 2020), jovens (73,8% entre 15 e 29 anos) e negros (79,1%) (FBSP, 2020). Os dados mostram que a vítima preferencial da violência estatal são jovens negros do sexo masculino e moradores das periferias e favelas.

Não por acaso, no Paraná em 2022, 54% das vítimas eram negras, enquanto essa população representa apenas 34% do total estadual, destacando a natureza racista dessas ações. Isso acontece desde sua origem, frequentemente justificada legalmente, como ocorre atualmente na chamada "guerra às drogas". É isso que fundamenta e naturaliza a violência policial em nosso país.

Os movimentos de familiares de vítimas da violência estatal têm uma história longa no Brasil e estão disseminados por todo o país, e são esses que organizam mobilizações e denúncias que contribuem para desvendar as ações fraudulentas perpetradas pelas forças policiais. É por causa da incessante busca por justiça de familiares, inclusive, que muitas das investigações acontecem - são esses familiares que frequentemente vão atrás de provas, perícias, cobram laudos, conseguem imagens, testemunhas, enfim, que fazem o papel que o Estado muitas vezes se omite de fazer. E se não fosse a pressão desses movimentos, muitos casos teriam sido arquivados sem qualquer apuração.

Quando aplaudem assassinatos e violações de direitos humanos cometidos pela polícia, quando buscam criminalizar a procura por justiça, setores da política institucional, representantes do Estado que deveriam estar a serviço da população, são também agentes dessa violência e aprofundam a dor dos familiares. Ao invés de atacar movimentos sociais legítimos, queremos saber quando o Estado vai acabar com os assassinatos cometidos pelas forças de segurança? Quando vai investigar os casos com transparência nos dados? E, principalmente, quando vai construir uma política efetiva de segurança pública que passa pela garantia de direitos fundamentais, como saúde, moradia, alimentação e educação para todos?

É imperativo que se respeite os movimentos de familiares, o seu direito de lutar por justiça, assim como a angústia e o luto das famílias vitimadas pelo Estado.

PELO FIM DA BRUTALIDADE POLICIAL!
TODA A SOLIDARIEDADE ÀS FAMÍLIAS DAS VÍTIMAS DA VIOLÊNCIA DO ESTADO!
POR MEMÓRIA E JUSTIÇA!


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